quarta-feira, novembro 21


ADEMIR - 2



As mãos plastificadas o depositaram sobre dois macios, suados e fartos seios.
Aquele mundo só seu ficou para trás. Ele soube naquele instante que não haveria volta. Teria de encontrar o seu porto seguro e, sem dúvida seria ali naqueles seios macios, suados e fartos que ele iria se proteger. Estava sedento e foi deles que ele se fartou. Sentiu-se seguro.
Algum cheiro ou simplesmente o contato de seus lábios com aqueles seios o fez perceber que não estava só naquele mundo novo. Aquele ser que o alimentava e o segurava com tanto carinho era o mesmo ser que lhe deu abrigo até o momento em que fora arrancado de seu mundo. Sim! Sentiu-se seguro.
Mas logo foi retirado de sua segurança e foi exposto a várias mãos estranhas. Elas não tinham o intento de o machucar e ele percebia que não eram para fazer-lhe mal. Os donos das mãos estranhas estavam certificando-se se estava tudo bem com ele.
Mas não estava!
Em uma sala ali próximo, um homem, alto, negro e forte apesar de manco, estava entre a preocupação e a felicidade. O homem era Rafael. Vinte e dois anos, motorista e ex-jogador de futebol.
Foi um dia uma grande revelação do esporte, pronto para despontar, não fosse uma entrada severa que recebera numa final da segunda divisão que lhe estragou o joelho para sempre.
Depois de muitos meses em tratamento, Rafael ouviu do médico a frase que quase acabou com sua vida...
_Infelizmente o senhor não poderá mais jogar futebol!
O seu grande sonho de conquistas que ele acalentava desde menino estava acabado. Não seria um novo Pelé. Depois de meses de angustias começou uma “carreira” de motorista de taxi. Mas agora tudo podia mudar. Se ele não podia ser o novo Pelé, o seu filho, recém, nascido o seria.
Rafael já se via nos campos treinando o filho para ser o grande “rei da bola”. O que ele não foi, seu filho seria!
 O médico que comandou o parto veio falar com Rafael e disse-lhe para esperar um momento! O médico respondeu ao afoito pai que sem dúvida era um menino, mas, devia aguardar mais uns minutinhos antes de ver o filho. Rafael não era marinheiro de primeira viagem, já tinha duas filhas e sabia que aquilo não era normal, mas o médico lhe garantiu que não era nada para se preocupar...
Rafael não se conteve em ficar ali parado. Desceu correndo pelas escadas e foi ter com seus amigos e parentes que o aguardavam em frente ao hospital.
_Um menino! Um menino! Um novo Pelé! Um novo Pelé! – gritava o orgulhoso pai.
Os amigos o abraçaram e o levaram para um boteco ali em frente para beber em homenagem ao novo Pelé.
Várias cervejas foram abertas em homenagem ao grande craque que havia surgido. Rafael tinha a certeza que seu filho seria uma grande estrela do futebol.
_É um brasileiro... E brasileiro é boleiro! – bradava Rafael – Deixa o basquete prôs gringos. Deixa a ginástica prôs russos, nós brasileiros somos do país do futebol.
Cida a cunhada, apareceu no boteco e chamou Rafael. Rafael não deu nem bola. Cida chamou novamente e Rafael foi ter com ela.
_O Doutor quer falar contigo...
_O que foi cunhada?...
_Não sei Rafael!... É melhor ir lá falar com ele!...
Rafael tentou pagar as bebidas, mas os amigos fizeram questão de pagar em homenagem ao grande craque que veio ao mundo.
Poucos minutos após, retornou um triste Rafael dizendo:
É cego!... Meu filho é cego!

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