sexta-feira, março 19

FELIZ ANIVERSÁRIO - 1


Acordou. Seria mais um dia como todos os outros dias. Mas neste dia era o dia de receber abraços, beijos e sinceros e hipócritas parabéns. Era seu aniversário. Trinta e seis anos bem – ou mal – vividos.
Barbeou-se e pôs a roupa de trabalho.
Como fazia sempre, fez o café.
Só que hoje, Tereza o beijaria de forma diferente. Era seu trigésimo sexto aniversário. Não ligava muito para a data, mas sabia que os familiares e amigos não esqueciam.
O leite ferveu, a cafeteira deu o sinal que o café estava pronto. Foi ao quarto acordar a mulher como sempre fazia.
_Aaamoorrr! Acorda!
Tereza abriu preguiçosamente os olhos e disse: Hum...
Ela pulou da cama e correu para o chuveiro. Ele ficou parado feito bobo de pau pensando: Puta que pariu...Ela nem lembrou...
Voltou à cozinha e ficou tomando vagarosamente seu café. Ouviu a mulher chamar as duas filhas e a bagunça delas para vestirem-se para irem a escola.
Tereza chegou na cozinha vestida para o trabalho junto com as duas pequenas.
_Tomem logo o café ou vão chegar atrasadas a escola. Foi tudo o que ela falou.
Tereza serviu sua xícara e sentou-se no outro extremo da mesa.
Sem dúvida ela nem lembra do meu aniversário pensou ele. E de fato ela só tinha atenção para as meninas, até que tocou o telefone...
_Alô! – Ela atendeu. Ele não ouvia o que dizia a outra voz mas somente a da esposa a falar: Sim! Ta bem! Ahã!.
Tereza largou o telefone e olhou para ele.
_Amor... Vou ter de ir a BH. É um contrato importante que temos de fechar.
_Tudo bem! Respondeu ele mentindo.
_Vou agora de manhã e volto amanhã, lá pelas seis da tarde...
_Tudo bem! Respondeu ele mentindo.
_Tudo bem?... Tu e as meninas vão ficar bem?
_Tudo bem! Respondeu ele mentindo.
_Se bem que a mamãe queria ficar com elas hoje... Se tu não se importar...
_Tudo bem! Respondeu ele mentindo.
_Então ficamos assim! Eu deixo as meninas na escola e a mamãe pega elas no final da aula. Amanhã quando eu chegar a gente vai na Pizzaria do Pandollo que tu gosta e depois pegamos elas e voltamos pra casa!
_Tudo bem! Respondeu ele mentindo.
As meninas ficaram prontas, tomaram o desjejum e foram com Tereza para a escola. Ele ficou parado uns bons dois minutos sem saber se deixava à lágrima que teimava em cair de seus olhos ou ia atrás da esposa e a enchia de caroços.
O tempo passou. A lágrima não veio e a raiva também passou ao ver a hora no relógio de parede. Era hora de ir para o trabalho. Foi.
Chegando no escritório foi surpreendido por todos os colegas ao abrir a porta...
_Parabéns a você...Nesta data querida... – todos cantavam entusiasmados.
Só ele não estava feliz! Era seu aniversário. Um dia que ele não dava muito interesse, mas o que o magoava era a esposa e as filhas não terem lembrado!
Ao meio dia, foi a uma churrascaria com os mais chegados que faziam questão de comemorar seu aniversário.
Ganhou alguns poucos, mas sinceros presentes e muitos abraços.
Voltou para o turno da tarde e quando o expediente terminou, sentiu-se só.
A esposa amada havia viajado a negócios sem ao menos lembrar de seu aniversário. As filhas estavam com a vó e nem sequer um telefonema.
Tão logo seu carro ganhou a rua viu Rafael, o rapaz que fazia o serviço de banco. Rafael ao ver o carro do colega acenou. Ele parou e ofereceu carona.
_Entra aí cara! – Rafael estranhou mas entrou.
_Diz onde mora que eu te levo pra casa.
_Ta brincando é? Ir pra casa? Eu vou é pra Taise!
_Ta! Diz onde ela mora que eu deixo-te lá.
_Onde mora? – falou o caroneiro espantado -. Em que mundo tu moras? Taise é o cabaré que o pessoal vai!
_Cabaré? Aonde o pessoal vai? – Uma idéia que ele nunca pensou ter passou por sua cabeça.
_Ué!...Parece louco! O pessoal sempre vai na sexta de pagamento na Taise! – no resto do caminho, Rafael explicou que todos do escritório iam no dia do pagamento para o cabaré da Taise. Era como uma obrigação.
_Até o Almeida?
_O Almeida? Ele que nunca falta.
_Ué! Nunca me falaram nada! – falou surpreso e ressentido.
_Claro né chefia! Tu é o cara tipo certinho! Quem iria te convidar?
_Então fazem coisas sem que eu saiba? Quer dizer: os meus amigos...
_Dãããããããã...
Ele ficou surpreso e P... da vida. O que eles pensavam que ele era?
_E o pessoal ta lá hoje?
_Lógico né chefia!
Ele pediu para dizer onde era, que ele iria não só leva-lo lá mas iria, curtir com o pessoal na tal Taise. Fora esquecido pelos seus em seu aniversário e não queria deixar aquela data em branco.
Parou o carro em um local que nunca pararia não fosse o abandono que estava sentindo. Tirou a gravata e o paletó a pedido do moleque. Achou estranho ser apalpado a procura de armas por um gigante com cara de bandido que logo ficou com cara de amigo ao dizer: Pode entrar doutor!
Custou um pouco a acostumar os olhos com a pouca luminosidade. O som era alto e a música não era a sua preferida, mas já a conhecia de ouvir de carros que passavam em frente ao seu prédio. – será que não a conhecia de ouvir no MP10 de suas filhas? – e o que ele viu não foi nada muito diferente dos bares de beira de estrada quando ele ia a praia.
Olhar de neófito. Logo viu que havia algo diferente. Havia um ar de sedução e sexualidade no ar.
Viu que estava em meio à prostituição e isso era algo que ele sempre condenou. A garganta secou. Viu no fundo uma janelinha onde havia um letreiro sofrivelmente escrito “copa”. Foi até lá e pediu uma cerveja. Pediu cerveja porque não viu no “menu” escrito a giz na parede refri. – Viu escrito coca, mas ficou com medo de não ser o refrigerante e sim a outra...-.


continua

Um comentário:

Humberto Orcy da Silva disse...

Muito legal o conto.
Gostei do saco, vou copiar.
Abração.